24 de outubro de 2011

O perigo oculto de Joinville

Joinville parece viver dias de notícias gloriosas em vários campos, notadamente o econômico. A revista Exame noticiou que a região polarizada por Joinville terá um dos maiores crescimentos econômicos do Brasil nos próximos anos. Recebemos notícias de novos investimentos com freqüência, quiçá até a vinda de uma famosa e importante montadora de veículos alemã! Nosso IDH é um dos melhores do Brasil, embora não sejamos na prática uma “Nossaville” plena.

Na área de educação, igualmente boas notícias se repetem. As escolas de Joinville destacam-se em premiações e índices de qualidade na educação, em âmbito estadual e até nacional. É claro que há também muito por fazer, a exemplo das escolas interditadas. No ensino superior, há vagas sobrando, novos cursos e novas instituições de ensino chegando à cidade, algumas renomadas, a exemplo da PUC e da UFSC, que se somam a outras boas universidades e faculdades de Joinville. Numa análise superficial, parece que estamos bem supridos! Quem debruçar-se com mais cuidado nesta seara verá que a situação pode não estar tão confortável.

Cursos ligados à gestão, engenharia e direito pululam das fileiras acadêmicas. Há mais vagas que alunos. É bem verdade que a necessidade de engenheiros e técnicos é maior que o número previsto de formandos, e certamente Joinville viverá um apagão de mão de obra qualificada em contraste ao boom econômico que se prevê. Por outro lado, parece-me que passaremos também por uma escassez de pensadores, intelectuais, estudiosos dos seres humanos e suas representações sociais, culturais e artísticas.

Naturalmente, não é necessário freqüentar os bancos universitários para ser um pensador ou um artista! Mas o fato é que Joinville está incipiente e muito aquém do necessário no que tange a cursos superiores na área de humanas ou artes e cultura.

Temos um conjunto de sítios arqueológicos privilegiadíssimos, com um museu de referência mundial, mas por que não um curso de Arqueologia? Somos a “capital mundial da dança”, ou qualquer seja a esfera da megalomania, mas não temos graduação na área. Não há cursos de Cinema, Artes Cênicas, Música, História da Arte... apenas um curso de Artes Visuais, que provavelmente luta para se manter aberto. Imaginar um curso de Museologia seria piada de mau gosto numa cidade cujos museus são interditados pela Vigilância Sanitária. A Secretaria Municipal de Educação, em iniciativa louvável, quer fazer de Joinville a Cidade dos Livros, mas se a própria biblioteca pública é provisória, o que dizer de um curso de Biblioteconomia?

Não há graduação convencional em Ciências Sociais, Sociologia ou Antropologia numa região onde vivem mais de um milhão de seres humanos. Está sobrando o objeto de estudo e faltando estudiosos! Ciência Política e Administração Pública viriam a calhar na Prefeitura, Câmara de Vereadores e outros órgãos públicos. E o que dizer do Serviço Social? Será que estamos tão bem assim para não precisarmos de um curso importante como este?

Há uma lógica perversa que alimenta esse abismo de humanidade que nosso ensino superior vive (se é que se pode usar uma palavra como “viver” para descrever nossa situação): a mercantilização acadêmica. Curso bom é curso que dá lucro ou alimenta a mão de obra que as empresas precisam. O curso da UFSC foi definido em parceria com entidades empresariais. O resultado não poderia ser outro: engenharia.

Entendo que as faculdades privadas tenham no lucro sua finalidade, mas o que dizer da UFSC e UDESC, públicas, e da Univille, comunitária? Sei que esta última já tem dificuldade de manter alguns cursos pouco comerciais, como as licenciaturas, mas está na essência do ser comunitário possuir cursos voltados à área de humanas e artes!

No caso da UFSC e Udesc, não há justificativa para não termos por aqui cursos que são oferecidos em Florianópolis, como Artes Cênicas, Cinema, Filosofia, Ciências Sociais, Serviço Social, Música, Biblioteconomia etc. Nossa vocação é tecnológica, compreendo. É preciso lembrar que por trás de qualquer tecnologia há o ser humano, e com ele, há relações sociais. 

Precisamos ser uma cidade onde as máquinas estejam a serviço dos homens e onde haja uma sociedade saudável. É aqui que mora o perigo: as relações sociais e humanas desequilibradas geram violência, pobreza, marginalidade, desestruturação familiar e outras mazelas que ninguém quer para sua cidade. 

Talvez o primeiro curso dentre os que certamente faltam à nossa Joinville é o de Filosofia. Quem sabe assim formaremos o “amigo do conhecimento” que vai perceber que a situação aparentemente confortável é traiçoeira e pensará como mudar o rumo.

"Tornou-se chocantemente óbvio que a nossa tecnologia excedeu a nossa humanidade". Albert Einstein

7 de julho de 2011

Mais vereadores, mais gastos, pouco resultado

Caros amigos!
Vários e-mails foram enviados sobre a questão do aumento do número de vereadores em Joinville. Mantive-me ausente da discussão, embora tenha acompanhado os pontos de vista, mas agora quero dar minha ponta de contribuição, espero que seja de alguma valia.

Embora confesse que por uma análise bem superficial e talvez simplista, tenho percebido que até aqui quem manifestou-se a favor do aumento do número de vereadores, grosso modo, é quem tem interesse direto no cargo de vereador – ou interesse próprio, ou de algum conhecido para o qual trabalhe. 

O que não é tão óbvio, mas também é matematicamente claro, é que os gastos com o aumento do número de vereadores AUMENTAM SIM. Muito se tem falado que o aumento não traria mais gastos ao município, uma vez que o repasse para a Câmara de 4,5% da receita municipal permanecerá o mesmo, com 19 ou 25 vereadores. O que ninguém tem dito é que os 4,5% que são repassados à Câmara de Vereadores não são de gasto obrigatório, e O QUE SOBRA DOS 4,5%, VOLTA AOS COFRES DO MUNICÍPIO. A Câmara pode até “carimbar” o destino dos recursos, ou seja, direcionar seu uso. Mas é obrigada a devolver o que sobra – e felizmente sobras vêm acontecendo todos os anos.

VEJA O QUE MUDARÁ COM MAIS SEIS VEREADORES –> Uma vez aprovado o aumento do número de vereadores, começará a reforma para construir mais 6 gabinetes; o processo licitatório de compra de mais 6 notebooks; o edital para aumentar o número de carros alugados – vergonhosamente um por vereador; as confortáveis cadeiras para os 6 novos vereadores; serão contratados mais dezenas de assessores parlamentares; mais milhares de cópias serão tiradas todos os meses; contas de celular pagas; milhares de reais em verbas de gabinete; MILHÕES de reais em novos salários só para os 6 novos vereadores; etc. NÃO HÁ MÁGICA QUE POSSIBILITE PAGAR TUDO ISSO SEM AUMENTO DE GASTOS, MINHA GENTE. Você conseguiria mudar tudo isso em sua empresa sem gastar mais nada? Não, né? A Câmara também não. Ninguém consegue.
Pode ser que o repasse de 4,5% não mude, mas o excedente que volta(ria) para a Prefeitura executar mais obras e serviços ou diminui, ou some.

Assim como vocês, eu também pago contas e sei que não há mágica que faça fechar as contas. Se as despesas aumentam, E VÃO AUMENTAR MUITO SE TIVERMOS NOVOS VEREADORES, a receita deve subir. Ou o excedente (nosso tão desejado LUCRO) deverá diminuir. Essa lógica também vale para a Câmara de Vereadores. Essa história de mais vereadores com os mesmos gastos é balela. Trata-se de tortura dos números para que eles falem o que queremos, não o que realmente são, como comentei no primeiro post deste blog.

Para colocar a cereja no bolo, informo que segundo soube, o salário de vereador passará a ser de R$ 15.000,00 mensais na próxima legislatura, a iniciar-se em 2013. Que beleza, não é? 6 novos vereadores representariam mais R$ 90 mil de salário por mês (sem contar 13º e horas extras), ou mais de R$1.080.000 por ano, ou 4 MILHÕES DE REAIS em apenas um mandato. E aí? Esse dinheiro vem de onde?

Agora reflitam: se nós que somos pessoas estudadas e com claro entendimento das coisas somos facilmente confundidos por quem inventou essa história de mais vereadores com gastos iguais, imagine a grande massa da população que nem sequer estudou!!!

Por isso, cabe sim a nós - indivíduos esclarecidos – debater esse assunto e fazer publicar os outdoors e colocar a boca no trombone, pressionando a Câmara a manter os atuais 19 vereadores. O Brasil deveria rever o seu número exagerado de parlamentares, jamais aumentá-lo.

Vamos parar de discutir e vamos AGIR. Porque reinventar a roda? Basta fazer outdoors iguais aos de Jaraguá do Sul. Temos que gerar grande mobilização contrária ao aumento de vereadores na cidade, e evitarmos que mais dinheiro público vá para o ralo.

Conta-se nos dedos os vereadores que efetivamente representam desinteressadamente a população da cidade. Não há razão alguma para colocar mais gente para fazer pouco ou (quase) nada.

Amo Joinville, sou contra mais vereadores.

Um abraço,

Guilherme A. Heinemann Gassenferth

"No regime democrático, todos os partido gastam todas as energias para demonstrar que os demais partidos não têm competência para governar. E todos eles estão certos."
(Henry Louis Mencken, Jornalista americano)

23 de maio de 2011

Os gays e a Bíblia - por Frei Betto

É no mínimo surpreendente constatar as pressões sobre o Senado para evitar a lei que criminaliza a homofobia. Sofrem de amnésia os que insistem em segregar, discriminar, satanizar e condenar os casais homoafetivos. No tempo de Jesus, os segregados eram os pagãos, os doentes, os que exerciam determinadas atividades profissionais, como açougueiros e fiscais de renda. Com todos esses Jesus teve uma atitude inclusiva. Mais tarde, vitimizaram indígenas, negros, hereges e judeus. Hoje, homossexuais, muçulmanos e migrantes pobres (incluídas as “pessoas diferenciadas”...).

Relações entre pessoas do mesmo sexo ainda são ilegais em mais de 80 nações. Em alguns países islâmicos elas são punidas com castigos físicos ou pena de morte (Arábia Saudita, Irã, Emirados Árabes Unidos, Iêmen, Nigéria etc). No 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 2008, 27 países-membros da União Europeia assinaram resolução à ONU pela “despenalização universal da homossexualidade”.

A Igreja Católica deu um pequeno passo adiante ao incluir no seu catecismo a exigência de se evitar qualquer discriminação a homossexuais. No entanto, silenciam as autoridades eclesiásticas quando se trata de se pronunciar contra a homofobia. E, no entanto, se escutou sua discordância à decisão do STF ao aprovar o direito de união civil dos homoafetivos.

Ninguém escolhe ser homo ou heterossexual. A pessoa nasce assim. E, à luz do Evangelho, a Igreja não tem o direito de encarar ninguém como homo ou hetero, e sim como filho de Deus, chamado à comunhão com Ele e com o próximo, destinatário da graça divina.

São alarmantes os índices de agressões e assassinatos de homossexuais no Brasil. A urgência de uma lei contra a violência simbólica, que instaura procedimento social e fomenta a cultura da satanização.

A Igreja Católica já não condena homossexuais, mas impede que eles manifestem o seu amor por pessoas do mesmo sexo. Ora, todo amor não decorre de Deus? Não diz a Carta de João (I,7) que “quem ama conhece a Deus” (observe que João não diz que quem conhece a Deus ama...).

Por que fingir ignorar que o amor exige união e querer que essa união permaneça à margem da lei? No matrimônio são os noivos os verdadeiros ministros. E não o padre, como muitos imaginam. Pode a teologia negar a essencial sacramentalidade da união de duas pessoas que se amam, ainda que do mesmo sexo?

Ora, direis, ouvir a Bíblia! Sim, no contexto patriarcal em que foi escrita seria estranho aprovar o homossexualismo. Mas muitas passagens o subtendem, como o amor entre Davi por Jônatas (I Samuel 18), o centurião romano interessado na cura de seu servo (Lucas 7) e os “eunucos de nascença” (Mateus 19). E a tomar a Bíblia literalmente, teríamos que passar ao fio da espada todos que professam crenças diferentes da nossa e odiar pai e mãe para verdadeiramente seguir a Jesus.

Há que passar da hermenêutica singularizadora para a hermenêutica pluralizadora. Ontem, a Igreja Católica acusava os judeus de assassinos de Jesus; condenava ao limbo crianças mortas sem batismo; considerava legítima a escravidão;e censurava o empréstimo a juros. Por que excluir casais homoafetivos de direitos civis e religiosos?

Pecado é aceitar os mecanismos de exclusão e selecionar seres humanos por fatores biológicos, raciais, étnicos ou sexuais. Todos são filhos amados por Deus. Todos têm como vocação essencial amar e ser amados. A lei é feita para a pessoa, insiste Jesus, e não a pessoa para a lei.

FREI BETTO é escritor.

19 de maio de 2011

Um novo Brasil!

Olá, meus amigos!

Eu me considero crítico, e às vezes alguém pode pensar que eu só sei criticar. Mas não, sei elogiar também, inclusive em temas polêmicos.

Segundo reportagem veiculada no Portal Terra, tramitam no Congresso 7 iniciativas para criação de novos Estados e territórios no Brasil. Aaaah, não! Não vai me dizer que você gosta dessa ideia! Desculpa, mas criar mais novos Estados representa criar novos governadores, senadores, deputados estaduais... É mais gasto pro Brasil e muito mais gente pra roubar!

Calma, existe este lado "ruim", mas não é bem assim. Vamos fazer uma análise menos impulsiva e mais parcimoniosa.


Esta é uma projeção do mapa do Novo Brasil caso as 7 iniciativas sejam aprovadas. Seriam criados os seguintes Estados e territórios: Solimões, Juruá e Rio Negro (dividindo o atual Amazonas em 4), Mato Grosso do Norte e Araguaia (dividindo o atual Mato Grosso em 3), Tapajós e Carajás (dividindo o Pará em 3), Maranhão do Sul (desmembrando o sul do atual Maranhão), Gurguéia (parte sul do atual Piauí), São Francisco (oeste da atual Bahia) e Oiapoque (o município de Oiapoque seria desmembrado do Amapá e passaria, sozinho, a ser um território federal). 

Essa nova configuração federativa seria excelente para o Brasil. Esta divisão traria três importantes benefícios para o país:

1. Desenvolvimento econômico - hoje, a região abrangida pelo proposto Maranhão do Sul, por exemplo, é esquecida pelo governo do Estado. Os principais investimentos seguem para São Luís e ajudam a consolidar a miséria e a falta de oportunidades que abundam na região que receberia o novo Estado. Com a sede de um governo estadual, os impostos da região que seguiriam para a capital necessariamente ficarão na região - os que não forem abocanhados pelo governo federal, é claro. A criação do Tocantins demonstra claramente o que estou dizendo. Com o Distrito Federal e Goiânia no sul goiano, a região norte ficou à míngua e à margem do desenvolvimento. A criação do Tocantins, em 1988, levou desenvolvimento para aquela região. 

2. Defesa à soberania nacional e 3. Defesa da Amazônia - com a criação de Estados e territórios em regiões fronteiriças como o Oiapoque, amazônicas, como Mato Grosso do Norte e Araguaia e fronteiriças e amazônicas como Juruá, Solimões e Rio Negro, além do já propalado desenvolvimento, é possível estabelecer sistema mais efetivo de defesa das fronteiras e de povoamento e colonização. Regiões despovoadas facilitam a eventual ocupação e invasão por parte de outros países. 

O Brasil passaria a possuir 37 estados e territórios e 1 Distrito Federal, somando-se 38 Unidades Federativas. Com a desvantagem de se criarem mais gastos públicos, mas que seriam subsidiados em boa parte pelos próprios impostos gerados no território da nova Unidade Federativa.

Seguindo na linha de raciocínio do desenvolvimento, eu ouso propor ainda mais novos Estados, pelo menos cinco:

1. Estado da Caatinga - seria formado pelo sertão do AL, PE, PB e RN; pelo agreste do SE, AL, PE, PB e RN e o sul do Ceará. Assim, uma das regiões com menores índices de desenvolvimento humano do Brasil estaria reunida num novo Estado, que teria centros urbanos importantes (Patos, Sousa, Juazeiro do Norte, Petrolina, Caicó, Crato, Mossoró) e saída para o mar, no agreste e sertão potiguares.

2. Estado de Porto Seguro - seria formado pelo sul e centro-sul da Bahia e norte mineiro, vale do Jequitinhonha e vale do Mucuri, num Estado que seria desmembrado de MG e BA e também abrange uma das regiões mais subdesenvolvidas do país, com ligação para o mar e potencial turístico importante. Os centros urbanos que se destacam são Teófilo Otoni, Montes Claros, Vitória da Conquista, Ilhéus, Itabuna, Valença e Porto Seguro.

3. Estado do Iguaçu - já foi um território brasileiro quando da 2ª Guerra Mundial, e poderia voltar para buscar o desenvolvimento das regiões Noroeste do RS, Oeste e meio-oeste de SC e Sudoeste do PR. Tem cidades importantes como Chapecó, Foz do Iguaçu, Cascavel, Guarapuava, Passo Fundo e Erechim. Tem forte apelo turístico (Foz do Iguaçu) e faz divisa com Paraguai e Argentina. Ajudaria a desenvolver regiões que são de certo modo preteridas pelas capitais dos respectivos estados.

4. Estado do Humaitá - abrange toda a mesorregião do Sul Amazonense. Possui uma população muito baixa (300 mil habs), e desenvolvimento econômico pequeno. Sua criação serviria para levar desenvolvimento (sustentável) àquela região, cortando ao meio o que sobraria do Amazonas (mesmo com a divisão em 4 já proposta no Congresso. Com a minha proposta, o Amazonas seria dividido em 5).

5. Estado do Tietê - formado pelo Oeste e Centro paulistas. A criação deste Estado serve para descentralizar o maior Estado do Brasil, facilitando a gestão no Estado e levando ainda mais desenvolvimento econômico à região, que já é uma das mais desenvolvidas do Brasil. Serve também para reduzir a hegemonia que o Estado de São Paulo representa no Brasil.

Após minha proposta de divisão territorial (que ainda não está no Senado ou na Câmara pois ainda não me candidatei), se aprovada a divisão em tramitação na Câmara, o país passaria a ter 43 Unidades Federativas.

Eu não tenho dúvidas de que isso seria revertido em vantagem para o desenvolvimento do país, a soberania nacional e, principalmente, para o bem estar da população dessas regiões.

Vamos discutir! Comente estas propostas e deixe sua opinião.

Guilherme Augusto Heinemann Gassenferth

18 de maio de 2011

Qualquer maneira de amor vale à pena, qualquer maneira de amor vale amar.

O título do texto foi extraído da música Paula e Bebeto, de autoria de Caetano Veloso e Milton Nascimento.
Dia 17 de maio, é o Dia Internacional Contra a Homofobia, e neste ano, completam-se 21 anos da retirada do "homossexualismo" da CID - Classificação Internacional de Doenças da OMS - Organização Mundial de Saúde. Há 21 anos a ciência reconhecia que não há doença, desvio ou disfunção no comportamento homossexual. A ciência já avançou, mas alguns homens continuam atrasados e retrógrados, tentando utilizar-se de textos escritos há mais de 3.500 anos como justificativa para suas conclusões.
No mesmo Dia Internacional Contra a Homofobia, o jornal Folha de S. Paulo, em seu editorial, age ou com má fé ou com leviandade e levanta preocupação com o Projeto de Lei Complementar 122 (PLC 122), notadamente porque, segundo eles, o PLC 122 é um mecanismo que poderá ser usado para cercear a liberdade de expressão. Veja trechos do texto:
"A amplitude e a indefinição dos termos ergueria uma espada sobre qualquer discurso ou escrito que condene a homossexualidade. Poderia ser acusado de ‘induzir’ a discriminação e, em tese, levar à pena de reclusão por um a três anos, mais multa."
Sim! Qualquer discurso ou escrito que condene a homossexualidade tem que ser criminalizado. Alguém pode escrever algo contra o negro? Contra o judeu? Contra o gay também não deve poder.
Nós gays não escolhemos nascer assim. Quem em sã consciência ESCOLHERIA um caminho que lhe renderá uma vida com preconceito, discriminação, intolerância, dificuldades? Ninguém, em pleno uso de suas faculdades mentais ESCOLHE ser algo que lhe trará prejuízos e sofrimento.
Eu fui educado em boas escolas; tenho pai e mãe casados, que sempre me encheram de amor e carinho e que convivem harmoniosamente com toda a família, muito bem estruturada; não convivi quando criança com gays ou lésbicas; assisti aos mesmos desenhos que qualquer criança de 26 anos assistiu; brincava na rua com os amigos; subi na árvore; nunca tive bonecas, mas sim carrinhos; sempre tirei boas notas na escola... e aí? Onde que o MEIO definiu que eu seria gay? Eu nasci assim. E tenho orgulho de ser assim.
Não tenho problema nenhum com heterossexuais, pelo contrário: devo minha existência à deles, e para mim eles são tão normais como eu. Nós gays amamos os heterossexuais e não criaremos uma “ditadura gay”. Jamais tentarei impor a algum heterossexual a "conversão" à homossexualidade, até porque isso não existe. A "conversão sexual" não existe e é um produto que mesmo no fim do século XX já era rechaçado.
Então, se eu nasci gay, se eu naturalmente sou assim, quem poderá acusar-me de estar errado? Se a homossexualidade é encontrada mesmo entre os animais, como não poderá ser algo natural?
O texto da Folha prossegue: “Parlamentares evangélicos temem que o projeto, se aprovado, venha criminalizar a pregação contra os gays. A relatora, contudo, propôs como única modificação ao texto da Câmara que seja aberta exceção para "a manifestação pacífica de pensamento decorrente de atos de fé".
Desculpe-me a Senadora Marta Suplicy, mas nem essa exceção deveria haver. Pregação contra os gays deve ser também crime! A ausência de pregação contra os gays não implica em aceitação da homossexualidade, mas simplesmente como um processo de tolerância, como o próprio Cristo ensinara. Ninguém quer obrigá-los a gostar de nós, apenas a nos tolerar e respeitar.
E afinal, quem tem direito de pregar contra mim? “Aquele que de entre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra”. (João, 8:7). A história das igrejas não é imaculada... de algumas, pelo contrário!
Ainda a Folha, em seu texto: “E se alguém se manifestar pacificamente contra homossexuais, mas não por motivos religiosos? Poderá ser preso, censurado?”. Evidentemente, deverá ser preso e censurado. Volto a comparar (afinal, será a mesma lei): alguém pode manifestar-se pacificamente contra os negros? Contra as mulheres? Não. E com a inclusão de idosos, deficientes e gays, nem estes grupos poderão ser alvo de manifestação “pacífica” contra. Pacífica entre aspas, pois não consigo enxergar como a manifestação contra uma minoria possa estar relacionada à palavra paz. Paz é a favor, não contra.
Aos religiosos das diversas denominações, tolero-os e respeito-os todos, e os amo como irmãos que somos em Cristo. E falando Nele... contou-nos Mateus, no capítulo 22, versículos 37 a 40: "Respondeu-lhe Jesus: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a lei e os profetas." E veja-nos o que ensinou-nos a Bíblia em 1 João 4:11 "Amados, se Deus assim nos amou, também nós devemos amar uns aos outros." É amor ao próximo essa peregrinação anti-gay que alguns líderes religiosos apregoam?
Continua o editorial: “A criminalização da homofobia resulta de um impulso nobre, que objetiva proteger pessoas discriminadas pelo que fazem em sua vida privada. Não pode, porém, servir para cercear liberdades que fundamentam a própria convivência civilizada e democrática.”. Meus caros editores, mesmo a liberdade precisa possuir limites. Não é porque somos livres que eu tenho o direito de fazer o que eu bem entender. Não posso pegar uma arma e atirar em alguém. Da mesma forma, a discriminação contra gays deve ser criminalizada.
Vamos à nossa Constituição Federal de 1988, que já em seu preâmbulo afirma: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”
Vamos adiante, na nossa Constituição Cidadã: “Art. 1º: A República Federativa do Brasil [...] tem como fundamentos: [...] II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana”.
“Art. 3º: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] IV – promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
E, por fim: “Art. 5º: Todos são iguais perante a lei. [...] III – Ninguém será submetido a tortura ou a tratamento desumano ou degradante”.
Hoje um conhecido afirmou: se um evangélico não quiser alugar uma edícula no fundo de sua casa para um gay, ele tem que ter esse direito. Peraí! E o gay pode ser humilhado porque o evangélico (no exemplo citado) não quer lhe alugar? Se isso não é submeter o gay a tratamento desumano, não sei o que é.
Citamos alguns dos principais trechos de nossa Carta Magna. O PLC 122 é isso. É um projeto de lei que reforça o que a Constituição já prevê. Por que não aprová-lo? Nós estamos falando de dignidade, cidadania, discriminação, preconceito, de uma SOCIEDADE FRATERNA, PLURALISTA E SEM PRECONCEITOS.
Prossigo ainda abordando a polêmica gerada com a capa do jornal Correio Braziliense do dia 11 de maio último, mostrando dois homens se beijando. Esta “barbárie” foi recriminada por vários puritanos, criticada pelas igrejas, mal falada pelos preconceituosos. Li que alguns reclamaram porque crianças “podem ver a capa”. E as crianças tem que ver mesmo! A imprensa deve noticiar a realidade da sociedade brasileira, e nós SOMOS UMA REALIDADE. Não podemos ser escondidos.
E os puritanos estão onde quando estes jornais sensacionalistas publicam fotos de corpos desfigurados por acidentes ou violência? E quando as crianças são expostas às notícias ruins que inundam nossos noticiários? Onde estão os puritanos nessa hora? Na igreja, rezando?
Em que canto do mundo estão os paladinos da moral ao saberem que nossas escolas têm índices piores de que países asiáticos ou latino-americanos? Qual o esconderijo desses eremitas morais quando as drogas estão se alastrando e iniciando os pequenos cada vez mais cedo? Será que os hipócritas não vêem a prostituição infantil cercear a infância de tantas crianças e adolescentes?
É certo que preocupem-se mais com o beijo na capa do jornal ou com a criminalização do preconceito contra os outros do que com educação, saúde e dignidade das crianças? Oras, que vão encontrar causas mais importantes para defender.
Nossos direitos não tiram os direitos dos outros. Quanto mais seres humanos tiverem direitos civis assegurados, mais pleno será o estado democrático que se busca em nosso ideário republicano.
Para finalizar o raciocínio de hoje: o Grupo Gay da Bahia (GGB) denunciou 198 assassinatos motivados por violência homofóbica. Alguém pode dizer que a homofobia não existe ou que ela é inofensiva? 198 pessoas perderam suas vidas porque eram gays, lésbicas, travestis ou transexuais. E isso, puritanos e moralistas, é certo? Cadê o berreiro? “Não matarás”, diz o decálogo de Moisés. Mas não é o que os homofóbicos assassinos observaram na hora de materializar seu ódio e seu destempero mental contra um homossexual. Vale dizer ainda que o número de homicídios homofóbicos está numa preocupante progressão, mas não esmoreceremos em nossa luta.
Tiradentes foi insurrecto por defender a redução da carga tributária. Gandhi levantou-se contra a opressão da metrópole inglesa imposta á Índia. Martin Luther King fez seu discurso ecoar em 1968 e ajudou a estabelecer direitos civis aos negros norte-americanos. Mandela fez uma revolução pacífica e ajudou a acabar com a segregação oficial que existiu até há pouco tempo na África do Sul. Gays brasileiros, é chegado o momento. Agora é a nossa vez de buscarmos pacificamente (mas com firmeza) nossos direitos, de procurarmos nossa inserção social, de lutarmos contra a homofobia, e de batalharmos pelo direito de amar a quem quisermos! Vamos em frente!
“E a gente vai à luta, e conhece a dor, consideramos justa toda forma de amor”. Lulu Santos
Guilherme Augusto Heinemann Gassenferth

27 de abril de 2011

Senado cospe e escarra na cara do Brasil

O Senado Federal mais uma vez vira palco de um teatro do absurdo, capaz de fazer inveja ao francês Eugène Ionesco. Pra mim, parece um picadeiro de circo invertido, com os palhaços assistindo na platéia! É, pode ser. Ou talvez Shakespeare ou Sófocles, ao depararem-se com a história que lhes contarei, poderiam encenar uma grandiosa peça de tragédia, pois não há outra palavra que descreva melhor o que acontece no coração do Congresso Nacional. 
Ontem, 26 de abril de 2011, foram eleitos os novos 15 titulares do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado, bem como o novo Corregedor daquela Casa. Confira a lista dos nobres Senadores, acompanhada dos respectivos serviços prestados à Nação:

Renan Calheiros (PMDB-AL):
- acusado de ter as despesas pessoais pagas por lobista de uma empreiteira interessada em licitações do governo;
- a Schincariol comprou uma fábrica de bebidas do irmão dele por preço superior ao de mercado. Logo depois, o excelentíssimo Senador conseguiu que o INSS perdoasse uma dívida de mais de 100 MILHÕES DE REAIS e outra igualmente milionária com a Receita. 
- foi acusado de envolvimento em esquema de arrecadação de recursos em ministérios como Saúde e Previdência Social, com direito a declaração do afilhado de casamento dizendo que ele próprio buscou sacolas de dinheiro para Renan. 
- Confira uma lista de outras acusações contra este homem de caráter: http://bit.ly/kxEP5w

Lobão Filho (PMDB-MA):
- é suspeito de ser sócio óculto de empresa que sonegou R$42 milhões de reais em 8 anos;
- responde a processo criminal sobre o funcionamento de emissora clandestina de TV;
- mas não se preocupem: ele alegou que as acusações são relativas à vida empresarial e não à administração pública. 

João Alberto de Souza (PMDB-MA):
- foi candidato a vice de Roseana Sarney; 
- envolvido em denúncias de irregularidade na sua posse como governador do Maranhão;
- coordenou operação Tigre, que matou 300 criminosos e pessoas sem passagem criminal;
- acusado de coordenar campanha para cassar prefeitos que não se submetam às ordens da governadora Roseana Sarney; 
- proferiu a frase: “fiz um governo 90% honesto”.

Romero Jucá (PMDB-RR):
- envolvido em empréstimos irregulares do Banco da Amazônia para empresa que foi sócio;
- denunciado por desvio de verba pública pra campanha da esposa à prefeitura de Boa Vista;
- acusado de envolvimento no Mensalão;

Humberto Costa (PT-PE):
- envolvido na Máfia dos Vampiros, que desviava recursos da Saúde, da qual é ex-ministro. 

Wellington Dias (PT-PI):
- acusado de promover em sua gestão de governador uma farra com diárias e ajudas de custo que beneficiaram aliados políticos. 

José Pimentel (PT-CE):
Não encontrei denúncias.

Mário Couto (PSDB-PA):
Não encontrei denúncias.

Cyro Miranda (PSDB-GO):
Não encontrei denúncias.

Antonio Carlos Valadares (PSB-SE):
Não encontrei denúncias.

Gim Argello (PTB-DF):
- denunciado por envolvimento no desvio de recursos do Banco Regional de Brasília;
- denunciado por desviar meio milhão de reais para entidades fantasmas.

Jayme Campos (DEM-MT):
- acusado de integrar a máfia dos sanguessugas;
- acusado de tráfico de influência na operação Lacraia.

Vicentinho Alves (PR-TO):
- acusado de não pagar colaboradores da campanha eleitoral.

Ciro Nogueira (PP-PI):
- acusado de prevaricação, por ter acobertado colegas deputados que moravam irregularmente em apartamentos da Câmara dos Deputados; 
- acusado de sonegar contribuições previdenciárias de entidade que dirigiu.

Acir Gurgacz (PDT-RO):
- segundo nota do jornal Correio Braziliense, responde a mais de 100 processos na Justiça, inclusive a acusação de fraude superior a R$ 3 milhões no Banco da Amazônia.

O Senado só pode estar de brincadeira. Renan Calheiros? Gim Argello? Lobão Filho? João Alberto? Mensaleiros, sanguessugas e vampiros? O que é isso? Por que o Collor não foi convidado?
De 15 titulares, só 4 não têm denúncias ou acusações! QUATRO SENADORES DE QUINZE! Isto é um despautério, uma vilania, um achincalhe à honradez da maior parte do povo brasileiro. Como pode o Senado desferir este golpe contra seu povo?
E vejam que bacana o significado de decoro, de acordo com o mesmo dicionário: “brio, dignidade moral, honradez, nobreza, decência”.
Mas nós também somos culpados. Não apenas porque o parlamento reflete a realidade de nosso povo, mas porque eles foram eleitos pelo povo. Nós não somos capazes de eleger um síndico que administrou mal o nosso prédio, mas elegemos senadores da laia de Calheiros, Sarney, Collor...
O mesmo Senado que já contou com a presença honrada de ilustres brasileiros, como a Princesa Isabel e Ruy Barbosa, hoje agoniza em dores da imoralidade e protagoniza o imperdoável superlativo do ridículo ao entregar o Conselho de Ética a senadores (com letra minúscula) com notório histórico de corrupção. 
“Os políticos e as fraldas são semelhantes: possuem o mesmo conteúdo”. Eça de Queiroz.
 Guilherme Augusto Heinemann Gassenferth

25 de abril de 2011

As cadeias, as escolas e os direitos humanos

A reportagem de ANotícia “Joinville nos planos do PGC”, desta segunda, 25/04, me assustou (confira clicando no link http://bit.ly/gzqQkL)

Ora, eu não sou ingênuo a ponto de acreditar que nossas cadeias e penitenciárias são oásis de tranqüilidade. Eu sei que existe tráfico de drogas, sei que existe comando de dentro pra fora do sistema prisional, hierarquia entre os presos, corrupção e mais uma infinidade de problemas.
Mas como pode existir tamanha organização? Os caras da facção PGC - Primeiro Grupo Catarinense - têm estatuto! Conselho! Reuniões! Comunicados! Dízimo!!!
Pasmem todos: Eles têm, segundo a reportagem, um ponto de venda com a “grife” PGC, dentro das cadeias. Ponto de venda dentro das cadeias? Já não é demais??? “Uma cela em cada galeria serviria como local de comércio”, prossegue a reportagem. “O projeto mencionava multiplicar por 40, [os pontos de venda] em dois meses”. Pára com isso. Tá errado demais! É complicado ACABAR com o tráfico de drogas dentro das cadeias, mas multiplicar por 40? Lojas de drogas dentro das nossas cadeias... Agora vejam o profissionalismo dos meliantes: “Metade seria investida no negócio. O restante iria para o caixa da organização criminosa e serviria para os propósitos da facção”. Desculpem-me a expressão, mas PQP!!! Esses bandidos desbancam muito empresário por aí. 50% para reinvestir no negócio.
Eu sou favorável aos Direitos Humanos. Nós não podemos tratar os apenados de forma indigna, sob risco de nos igualarmos a eles. O que não pode é dar mordomia, regalia, vida boa. Os caras queimam colchão pra fazer rebelião e depois vem outro, inteiro? Agora tem que dormir no chão!!! Os caras fogem, são recapturados e voltam pra cela normal? Agora vai ficar na cela isolada!!! Foi pego com um celular, droga ou lixa que a mulher trouxe na visita íntima? Acabou a visita íntima!!! 
Assim não dá pra ficar. Se temos inteligência no governo, temos gente, temos dinheiro dos tributos, temos as soluções que são apontadas por especialistas e mesmo pelo próprio governo, porque o problema não acaba de uma vez?
Para fugir um pouquinho do fato mas não do tema: um preso custa ao Brasil, segundo o relator da CPI do Sistema Carcerário, Deputado Federal Domingos Dutra (PT-MA), entre R$1.300 e R$ 1.600 por mês. São 440 mil presos no Brasil, então se gasta quase 8,5 BILHÕES de reais por ano com essa cambada.
Já de acordo com o INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, órgão ligado ao Governo Federal, nas três esferas governamentais o investimento em educação foi de R$ 193,08 mensais para estudantes do ensino médio.
“Quem abre uma escola, fecha uma prisão”. Victor Hugo, intelectual francês.

24 de abril de 2011

Os números não mentem! Mas bem conversadinho, dizem o que você quiser...

Santa Catarina é o segundo melhor estado do Sul do Brasil em índices de analfabetismo. É, mas agora, vejam outra informação:
Santa Catarina tem o segundo pior índice de analfabetismo do Sul do Brasil. 
As duas informações são verdadeiras: SC está atrás do RS e à frente do PR em números de analfabetismo, segundo o IBGE, com dados de 2009. O que se fez foi interpretar irresponsavelmente estes dados e criar informações tendenciosas. Eu li isso numa manchete da RBS estes dias. Como um grupo de comunicação tão importante pode produzir uma informação assim? É óbvio que o Estado que ficar na segunda colocação de “cima para baixo” no Sul, será também o segundo colocado de “baixo para cima”. Ora, são apenas três Estados!
Uma matéria da revista Superinteressante de 1994, escrita por Thereza Venturoli, trouxe um dado curioso: de acordo com o Censo do IBGE de 1980, havia 21.029.031 homens e 20.945.834 mulheres casados no Brasil. Há casamento gay no Brasil? Não, homem só pode casar com mulher. Há casamentos bi, tri ou poligâmicos no Brasil? Não, um homem só pode casar com uma mulher. Então como pode existir um número diferente de homens e mulheres casados?
O IBGE não mentiu... mas foi irresponsável ou incompetente ou no planejamento, ou na coleta, ou na compilação dos dados. Só maiores de 15 anos foram considerados na hora de responder o Censo, e havia muitas meninas menores de 15 casadas no interior do Brasil. É claro, ficaram de fora da conta.
Agora, vamos dar uma voltinha pela história.
No século XVII, dois cientistas franceses malucos, mas inteligentes, estabelecem as bases para a probabilidade: Blaise Pascal e Pierre de Fermat. Pascal, o pai da primeira calculadora mecânica, tinha visões religiosas que o fazia se enclausurar em mosteiros. Fermat não era afeito a publicar suas descobertas e escrevia nas margens do livro Aritmética, de Diofanto. Nestas margens, o matemático escreveu seu Último Teorema, que deixou dezenas gerações de matemáticos malucos até 1995. Sim, mas e daí?
Daí que o estudo das probabilidades levou os estatísticos a inventar um método interessante: a amostragem. A amostragem diz que é provável que, se um bolo estiver bem misturadinho, uma fatia retirada dele vai conter proporcionalmente a mesma coisa que o bolo todo. Suponhamos que seja um bolinho bem simples, bem “jacu”: 10 partes de trigo, 10 partes de leite, 10 ovos e 10 partes de açúcar. Se eu cortar este bolo em 10 fatias, é provável que uma fatia contenha, tudo misturado e já assado, uma parte de trigo, uma parte de leite, um ovo e uma parte de açúcar.  Entenderam?
Então a amostragem é mais ou menos isso: se em uma fatia eu consigo ver tudo o que tem no bolo, não preciso comer as dez fatias para saber tudo o que nele estava contido. E esse bolo pode ser o Brasil, o mundo, a sua cidade, sua universidade, sua empresa... A amostragem tornou-se um recurso para se fazer pesquisas que consigam inferir como é o todo ao analisar uma parte. Mas a amostragem carrega um perigo! Hmm... vejam só essas notícias bombásticas:
Pesquisa revela que bairro Saguaçu, em Joinville, é o melhor lugar do mundo para viver. Sim, perguntei pra minha mãe e pra mais cinco vizinhos daqui da rua. 100% pensam que aqui é o melhor lugar do mundo pra se morar.
Homens joinvilenses não gostam de caldo de peixe. Pesquisa realizada em abril demonstrou que 66,7% dos homens de Joinville não gostam de caldo de peixe. Eu gosto, mas meu pai e meu irmão não curtem muito. 
Pessimismo deixa careca. Outro caso real, que saiu nos jornais: uma empresa japonesa de cosméticos constatou que homens pessimistas têm cabelos mais fracos e tendem a ficar carecas. Foram entrevistados 733 homens entre 15 e 59 anos de idade, em Tóquio. Resultado: 51% dos que se consideravam pessimistas disseram que seus cabelos estavam ficando fracos, enquanto 47% dos otimistas percebiam algum sinal de calvície. (Extraído da reportagem da Superinteressante já citada acima). 
Há problemas nestes estudos. Pode ser que a amostra tenha sido muito pequena, como nos dois primeiros casos. No terceiro caso, os números 51% e 47% estão muito próximos para afirmar-se com tanta contundência que o pessimismo deixa careca. Além disso, pode ser que os entrevistados não representem a população como um todo. É preciso estratificar a população e entrevistar pessoas que representem, proporcionalmente, toda a população. Se o Brasil tem aproximadamente 50% de homens e 50% de mulheres, uma pesquisa com credibilidade deve ouvir 50% dos entrevistados do sexo masculino e os outros 50% do sexo feminino. Ao se realizar uma pesquisa de abrangência nacional, é preciso realizar entrevistas em várias cidades do Brasil, tanto nas capitais, quanto no interior, em cidades grandes e pequenas, ricas e pobres. A amostragem escolhida precisa representar proporcionalmente o todo.
Em meu blog, pretendo me dedicar muito à análise de estatísticas, sobre todos os temas que me propus a encampar. E achei justo reinaugurá-lo justamente mostrando como os números podem nos levar a interpretações erradas. Por isso, se você for um de meus escassos leitores, avalie cuidadosamente o que eu escrever. Mesmo eu estando sempre alerta ao que os números maldosos querem esconder de mim, sempre pode passar alguma coisinha.
Vale dizer também que não sou matemático, estatístico ou estudioso de qualquer ciência exata. :)
Eu agradeço muito sua visita e a leitura :)
“A matemática é a única ciência exata em que nunca se sabe do que se está a falar nem se aquilo que se diz é verdadeiro”. Bertrand Russell, filósofo britânico do século XX.